Bate-Bola | Rosália Silva | 08/08/2004 21h28

Orlando Silvestre fala sobre o trabalho do xadrez em MS

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Orlando Silvestre fala sobre o trabalho do xadrez em MS

O presidente da Fesmax (Federação de Xadrez de Mato Grosso do Sul) Orlando Silvestre Filho, 45 anos, recebeu o site Esporte Ágil para uma conversa. Ele que é de Porto Murtinho, filho de militar, considera três cidades como "suas": Porto Murtinho, Corumbá e Campo Grande. Orlando, antes de iniciar o Bate-papo, explicou um pouco da dinâmica deste esporte que envolve muito a capacidade de pensar e a de "ludibriar" o adversário. Segundo ele, o xadrez é um jogo muito limpo e que o juiz só interfere se alguém apelar. "Se algum jogador levantar alguma dúvida serão os três primeiros do ranking, os melhores jogadores, que decidirão. E se um dos três estiver envolvido, é chamado o quarto e o quinto... É igual Direito, nós somos legalistas mesmo. É na hora que é tomada a decisão". Apaixonado pela modalidade afirma que não tem data para deixar de competir.

Esporte Ágil - Como você começou a praticar esportes?
Orlando Silvestre - Eu era uma criança superativa e minha mãe decidiu me colocar no judô, em 71, pra ver se me acalmava. O primeiro esporte que fiz foi o judô, eu fiquei dois anos e também jogava bola pelo Dom Bosco, porque o meu 1º e 2º graus só foi em colégio salesiano, lá em Corumbá e aqui em Campo Grande. Então veio o judô, que foi muito bom, me acalmou um pouco nas brigas. Mas o primeiro esporte que fiz foi o futebol. Joguei na seleção do Dom Bosco, joguei na São Bento dos Buainains, do senhor Assef da Drogaria São Bento, e depois tive a oportunidade de jogar na Escolinha do Operário. Sou operariano e vesti a camisa preta e branca da escolinha e nessa época eu já era velocista. Foi quando o técnico Castilho descobriu que no juvenil tinha um velocista, uma pessoa que corria, e ele me convocava pra jogar nos coletivos com os profissionais. E da escolinha de base ele me escalava para ir treinar nos coletivos do profissional quando algum jogador estava machucado. Ele me escalava porque pedia para fazerem um lançamento em diagonal e eu saía correndo, pelo menos forçava a defesa a correr bastante, isto naquela época do Operário super bom. Os coletivos na escolinha eram disputadíssimos, no profissional era uma enganação, os jogadores faziam corpo mole, marcavam a dois metros e eu só colocava a defesa para correr. Mas a minha paixão pelo atletismo foi forte e eu parei o futebol para ir para o atletismo. Disputei por três anos atletismo por São Caetano do Sul - SP, que hoje domina todo o esporte em São Paulo, os jogos regionais e os jogos abertos do interior paulista, é atualmente penta campeão. Lá tive a oportunidade de conhecer a cantora Simone, que jogou basquete quando eu era do atletismo e geralmente o basquete ficava quase do lado do atletismo masculino no alojamento. A Hortência, a Norminha, todo esse pessoal que chegou a fazer sucesso no basquete eu conheci em São Caetano.

Esporte Ágil - Mas você foi para o São Caetano já como profissional?
Orlando Silvestre - Fui como contratado, saí daqui, tinha ganhado em São Paulo a Operação Juventude em 1976 e fui chamado de revelação nacional, com projeção nacional , página inteira do jornal Gazeta Esportiva e me levaram para o São Caetano. Foi o Renato Ionamine que me levou, ele era de Campo Grande e estava lá em São Paulo. Fiquei três anos lá e acabou que eu entrei na faculdade aqui. Meu pai faleceu quando eu tinha 10 anos, então ficaram eu, três irmãs e minha mãe. Quando vi a realidade da Casa dos Atletas, eu tinha um padrão de vida aqui em Campo Grande e assim não quis ficar. Porque na Casa se você não dá resultado eles dispensam você. E no atletismo, hoje tem os índices olímpicos, e naquela época de 76 a 79 também tinha um índice, o técnico dava dois meses pra você atingir esse índice, porque com aquela marca de tempo poderia competir, agora se não atingisse o índice você era dispensado e só voltava no outro ano, porque lá tinha a questão do estágio, era um ano o estágio. E se não conseguisse o índice você era dispensado da equipe. Tinha que ser atleta de ponta. Por isso, fiquei três anos em São Caetano e não quis ir para a Casa dos Atletas porque eu via o tratamento. E eu o único homem da família, tinha três irmãs solteiras e a minha mãe, tudo criança, dos 10 aos 16 anos e como tinha a minha faculdade, fiquei aqui.

Esporte Ágil - Qual a faculdade que você fez?
Orlando Silvestre - Eu estava fazendo faculdade de Veterinária e depois de Biologia na Universidade Federal, aqui em Campo Grande. E foi na faculdade que comecei a fazer o xadrez. Eu já jogava xadrez, tinha noção. A partir daí comecei a jogar xadrez.

Esporte Ágil - E na faculdade você começou também a disputar?
Orlando Silvestre - O primeiro título que tive na minha vida faz 30 anos. Em 1974, nos Jogos Salesianos, pela seleção da oitava série que jogava contra as outras séries a gente ganhou xadrez. Eu jogava xadrez, mas jogava por jogar. Como lá se fazia todas as modalidades, nos Jogos Salesianos do Dom Bosco eu consegui colocar alguns alunos bons de esporte, o Marco Túlio, Serginho da Corpo Livre. A gente ganhava todas as modalidades nos Jogos Salesianos.

Esporte Ágil - Você contou quantos títulos você tem no xadrez?
Orlando Silvestre - Não, sei que já ganhei todos os títulos que uma pessoa pode ganhar aqui no Estado. E estou conseguindo algumas conquistas fora, porque geralmente quando a gente leva até um campeonato grande existem os eventos paralelos, que vão ocupar a todos, já que o xadrez em evento oficial a pessoa fica quatro horas jogando, então a pessoa vai ficar quatro horas esperando. Então você começa o campeonato e tem os paralelos geralmente com um ritmo de horas menor, quer dizer enquanto uma rodada principal do campeonato brasileiro demora 4 horas ou no mínimo 3 horas, no nosso paralelo demora 2 horas. Com isso dá tempo de você arrumar, começar o campeonato e aí começa o evento paralelo. Geralmente no evento paralelo eu consigo me colocar bem e entrar na zona de premiação em dinheiro. E aqui no estado fui campeão absoluto, que é um por ano, o principal, ganhei em 93. Aliás, digo que é mais fácil eu voltar a um banco escolar e me formar para qualquer curso, seja medicina, física nuclear, e eu sei que eu vou conseguir, do que falar que se voltar a estudar 5 ou 6 horas de xadrez por dia, eu não garanto que serei campeão estadual absoluto no meu Estado. É mais difícil ser campeão estadual absoluto do que fazer qualquer curso universitário no Brasil, porque no xadrez existem os talentos. O xadrez permite que você seja jogador, árbitro, diretor, comissão de apelação, diretor de federação, tudo que há dentro de uma competição. No meu caso, aqui no Estado tem vezes que sou tudo, é uma característica da modalidade.

Esporte Ágil - Você estava contando que compete pela paixão do esporte. E o que mais o atrai no xadrez?
Orlando Silvestre - O xadrez tem alguns conceitos, primeiro que ele é cultura. Eu vou explicar rapidamente no tabuleiro porque que ele é cultura. O xadrez tem mais ou menos dois mil e poucos anos, quase nas mesmas regras, essa abertura aqui que move peão na frente do rei as brancas, as negras respondem com um peão rei que chama espanhola. Peão do bispo da dama que é siciliana, que é italiana, peão na frente do rei uma casa que é a francesa. Isso aconteceu porque esses países desenvolveram essa teoria de abertura do peão, duas casas na frente da dama do rei é a escandinava. Essa abertura aqui, peão na frente da dama é a holandesa, vem da Holanda. Peão duas casas na frente do bispo da dama, é inglesa. Então porque são países que desenvolveram essas aberturas, estudaram e deram nomes a essas aberturas. É ciência, pelos cálculos desenvolvidos. E é esporte. Um jogador disputando uma partida oficial no Campeonato Mundial, ele tem um gasto calórico igual de um trabalhador batendo pedra oito horas. A pessoa tem que estar bem preparada fisicamente para suportar o desgaste calórico. Hoje a ciência explica tudo isso, porque o órgão que mais consome oxigênio, energia e nutrientes fundamentais é o cérebro. E o nosso órgão de exercício é o cérebro, então se você consegue fazer todos esses gastos é porque você esta usando o cérebro. E outra coisa importante de colocar é a questão hormonal, o choque de adrenalina, a hora que você faz uma boa jogada, você fica com muito prazer, mas a hora que você faz uma má jogada que você perde a partida, você tem um choque de adrenalina, isso explica muitas coisas na vida. Que dá uma descarga, que você entra em sudorese, palpitação, cada um tem sua reação própria. É muito forte o choque da adrenalina, você tem prazer, você fica muito contente, mas o choque de adrenalina se a pessoa não tiver com o corpo preparado...

Esporte Ágil - Então é necessária a prática de atividades físicas, paralela a prática do xadrez?
Orlando Silvestre - E junto com o estudo. Primeiro porque você passa quatro horas sentado. No mundo era um jogo por rodada, por dia. Com o jeitinho brasileiro inventou o Brasília System que é disputado em um fim de semana, enquanto o xadrez clássico não permitia isso. A Federação Internacional agora que permite 20% das rodadas serem duplicadas.

Esporte Ágil - E você pratica alguma atividade física?
Orlando Silvestre - Caminhada e alongamento, todo dia.

Esporte Ágil - Agora quais os projetos para o segundo semestre?
Orlando Silvestre - A Federação Sul-mato-grossense de Xadrez, que eu sou presidente pela quarta vez, sou atleta há 30 anos, sou presidente ou membro de federações desde 82, há 22 anos, já participei de cinco diretorias fortes de federações. A minha primeira federação foi a de atletismo. No atletismo eu fui secretário geral, habilitei o atletismo no CND. Depois foi a Federação Universitária, na faculdade. Aí entrei no xadrez, futebol e ciclismo, que na época eu acompanhei, fui a primeira pessoa a fazer como dirigente o mountain bike no Estado. O xadrez eu peguei no segundo mandato, fui do terceiro, fiquei fora como presidente mas na diretoria do quarto mandato e voltei no quinto e sexto mandato. A Federação de Xadrez teve seis mandatos eu fique em quatro. O xadrez mudou a realidade na primeira vez a gente fazia em média 10 a 20 competições no máximo, por ano, e tinha 200 jogadores. Hoje, a Federação de Xadrez é sem dúvida a mais ativa em números de eventos, nós fazemos 120 eventos no ano e temos 2,2 mil jogadores. Fora os projetos federais, que agora está algo muito fora da realidade do Estado. O Projeto Federal [Xadrez nas Escolas] está proporcionando um intercâmbio muito grande, quase para colocar a gente no nível nacional. E estou no Conselho Estadual de Desportos há 16 anos, sendo reconduzido agora para mais quatro anos. E fui presidente do conselho em três mandatos. Cheguei na presidência do Conselho com 35 anos e a média dos presidentes era de 55 anos. O presidente de hoje tem, se não me engano, cerca de 70 anos, então eu sou uma pessoa que rompeu muitos dogmas, de chegar cedo nas estruturas.

Esporte Ágil - E porque estar à frente de diversas organizações, é para ajudar o pessoal a desenvolver as modalidades?
Orlando Silvestre - Gosto muito do ciclismo, joguei futebol, só não fiz carreira no judô, fui do atletismo no começo da federação e depois o xadrez, esporte que pratiquei. Na verdade eu só assumi cargos nas federações que eu tinha afinidade. Somos convidados para várias e como sou membro do Conselho há 16 anos, eu vivi a legislação da ditadura, a Lei Zico, a Lei Pelé 1 e 2, Estatuto do Desporto. Eu tenho vivência em vários sistemas de legislação, conheço bem. Dezesseis anos dá para fazer mestrados, doutorado. Na legislação esportiva sou muito bem diferenciado pelos parceiros nacionais e agora que resolvi fazer esporte não como profissão mas como atividade. A gente ajuda com o conhecimento, porque consegui fazer um projeto muito grande, esse projeto Federal Xadrez nas Escolas hoje vai envolver 20 mil escolas em três anos e o orçamento dele é de somente 32 milhões de reais. Eu sou consultor-gerente, então você tem uma know how hoje, em Brasília. Como no Estado trabalhávamos muito bem o xadrez sem ter dinheiro, então fomos convidados, o projeto foi enviado em 2000 para Brasília e hoje já está na fase de execução.

Esporte Ágil - Quais atletas do Estado que são destaques no xadrez?
Orlando Silvestre - Posso citar quatro grandes talentos que poderiam se profissionalizar tanto nacional, quanto internacionalmente. O principal talento nosso que hoje está morando em Brasília é Lenita Leite Pinho que com 12, 13 anos foi campeã estadual absoluto. O André Cavallieri que é outro talento e hoje está com uns 20 anos, era pra ser um profissional de xadrez, mas ficou aqui no Estado por um motivo ou outro. Tivemos o Paulo Rodovalho, que hoje trabalha na Justiça do Trabalho, também tinha condições de se profissionalizar. E hoje temos o Gabriel Marques, um garoto de 12 anos, que já é bicampeão brasileiro, ele aos nove anos já viajava com a Federação, faz quatro anos que está no trecho, foi agora disputar Pan-Americano na Colômbia. Nós temos muitos destaques, o Marcelo Lopes que foi campeão brasileiro escolar por equipe, o Jairo Medeiros, que ganhou o Mercosul infanto sub 18 lá no Paraguai. Então, estes são destaques, e todo mundo colabora. O Marcelo Gralha que hoje é o maior teórico do xadrez sul-mato-grossense, o Roberto Fedrizzi primeiro Presidente da FESMAX. Mas o xadrez tem as suas escalas, se você é jogador regional e estadual é uma coisa, você ser jogador nacional é outra, e ser internacional também. Se a pessoa quiser seguir carreira e viver do xadrez, ela tem que sair daqui, tem que ficar aqui no Estado até um certo nível, depois se ela quiser evoluir tem que ir pra centros mais avançados.

Esporte Ágil - O pessoal consegue sobreviver financeiramente do xadrez?
Orlando Silvestre - Hoje consegue porque o xadrez, não no nosso Estado que tem uma política ainda de massificação, hoje em qualquer cidade se você for jogador de nível, ela te dá uma moradia, alimentação e uma possibilidade de intercâmbio. Estados como Santa Catarina, São Paulo e Paraná têm condições de contratar para jogar pelas suas cidades as competições. O que falo para os jovens hoje é que se ele se dedicar, tem garantia de moradia, alimentação, intercâmbio, curso superior até os 30 anos. Dá para a pessoa fazer um curso superior, um mestrado, um doutorado, tudo pago pelo xadrez, e aqueles com maiores destaques, já falamos em milhares de dólares, dá para ganhar de 2 a 5 mil dólares ao mês na América, em um nível internacional, já que os europeus ganham muito mais.

Esporte Ágil - A Federação está mais presente em Campo Grande e Corumbá, pelo menos nos últimos meses são as cidades que têm realizado mais competições. E nas outras cidades como está organizado o xadrez?
Orlando Silvestre - A Federação de Xadrez tem um problema cultural aqui no Estado, no começo íamos atrás de todas as iniciativas do xadrez, mas a partir do momento que a gente começou a ser estruturado, ter uma carga de eventos, nós tínhamos um problema: um lavrador me perguntou se o xadrez ia dar futuro para o filho dele. Ele era um ex-bóia-fria, que nunca viu xadrez. O garoto tem talento, mas com isso eu entendi que não podemos fazer o xadrez em cidades pequenas porque as pessoas da comunidade, imagine o pai é bóia-fria, passou a vida inteira no cabo da enxada e o filho jogando xadrez, então é um choque cultural muito grande. Então a Federação resolveu que não irá às cidades pequenas, por questões culturais. Priorizamos os pólos do xadrez, simplesmente de um trabalho que foi feito em Laguna Caarapã, que é uma cidade pequena perto de Ponta Porã, e que 100% das escolas têm xadrez, a iniciativa foi de um professor que saiu de Dourados foi e implantou. A Federação nunca foi a Laguna Caarapã, apesar de ser uma cidade que tem 100% de xadrez. Hoje, Corumbá é um grande pólo que a gente conseguiu desenvolver, Três Lagoas com a Funlec hoje faz um trabalho muito bom da primeira a quarta série do Ensino Fundamental. Vai colher seus frutos daqui a 2, 3 anos, quando ninguém aqui do Estado vai ganhar de Três Lagoas nessa faixa etária, porque ninguém trabalha nessa faixa etária. As crianças agora foram para uma aula com Mequinho, que foi gênio grande campeão brasileiro, em Ilha Solteira. Foi um ônibus com 35 pessoas, ficaram lá dois dias com o Mequinho, as crianças não sabem quem é ele, mas quando elas crescerem vão se lembrar que o grande mestre um dia foi seu professor. Elas tiveram aula com o Pelé do xadrez brasileiro e elas são crianças, tem 6, 7, 8 anos, elas não sabem a importância disso. Dourados tem o Silvio Melo, que agora é o nosso campeão de Dourados, temos um destaque. Falta implementar mais estruturas de eventos em Dourados. Assim como também nós temos Paranaíba, o Paulo Rodovalho é de lá. Temos um núcleo em Naviraí e temos acompanhado de longe o trabalho da Fundação Bodoquena e trabalha com mais de mil crianças internadas e têm aula de informática e xadrez. Então a Federação de Xadrez não vai até as cidades pequenas. Nova Andradina fez um pólo bom, articulou e a gente não foi em Nova Andradina, porque, não que o xadrez não possa ser praticado, mas a Federação só vai numa instituição, numa cidade, quando ela vai fazer um projeto contínuo, faz um evento daí começa o desenvolvimento, intercâmbio, não faz um evento isolado. A Federação só se envolve se tiver viabilidade do projeto. Por exemplo, Itaporã também teve um trabalho excelente ao lado de Dourados com um núcleo pequeno, a Federação nunca foi em Itaporã. Maracaju no MS Olímpico ganhou seis troféus, dois de xadrez. A gente faz intercâmbio só de papel mas a Federação ainda não foi em Maracaju, já tem pólo. Então nós temos xadrez, mas para cidade pequena a Federação não vai e enquanto eu estiver presidente não vai mesmo. Porque há um choque cultural você perde tempo, dinheiro. O dia que eles saírem de lá, quiserem viver outra realidade. Nisso o xadrez joga claro e limpo, é cidade pequena a Federação não vai porque a pessoa não tem cultura para absolver, infelizmente não tem.

Esporte Ágil - Está marcada também a vinda de um grande astro do xadrez aqui para Campo Grande, no dia 26 de agosto, aniversário da cidade.
Orlando Silvestre - Isso, o Anatoly Karpov, que já esteve aqui em 95. Na época, há dois anos ele tinha perdido o título mundial e achava que podia disputar o seu sexto título mundial. Ninguém tem esse número de títulos mundiais pela Federação Internacional. O doutor Roberto na época empatou com ele, então na época nos pagamos um cachê de 10 mil dólares para ele vir jogar aqui, e é a segunda vez que ele vai vir jogar uma simultânea. Ele deve jogar aqui com 60 crianças ao mesmo tempo. É um grande nome mundial, na categoria absoluto, acho que por categoria ele tem 16 títulos mundiais, tem o absoluto que é o número um e tem as outras por categoria. As crianças do projeto federal Xadrez nas Escolas talvez não saibam que é ele, mas depois vão se lembrar e saber quem é Karpov. Isso é um grande prazer pra gente. E quando foi anunciada essa simultânea, várias pessoas que estavam até fora do xadrez ligaram querendo jogar com o Karpov. É um fato histórico você jogar num campeonato mundial e todo mundo quer jogar, mas nesse evento ele só vai jogar com as crianças do projeto.

Esporte Ágil - Qual a sua avaliação do projeto Xadrez nas Escolas?
Orlando Silvestre - O principal objetivo do Xadrez nas Escolas é propiciar que seja implantado um núcleo de xadrez dentro da escola. O projeto se instala, é doado os materiais, os kits, jogo de peças e é capacitado o professor que tem de 8 a 10 semanas pra dar o "b-a-bá", o início do xadrez. E se pretende implantar 20 mil pólos desses, aqui nesse caso, a gente remunera o professor em 600 reais. Os representantes do Mec estiveram em Campo Grande e ficaram surpresos pela nossa articulação, tanto a nível político, que os secretários Hélio de Lima e o Rodrigo Terra estavam a par do projeto e acompanhando, seja a nível de mídia que todas as etapas do projeto estão documentadas, seja por mídia via impressa, internet e algumas com mídia de televisão. Então a gente conseguiu ter uma boa cobertura de mídia e como aquela era uma referência do projeto, a gente conseguiu passar muito know how para as escolas que se envolveram com a Federação, porque nem todas se envolveram com a Federação, uma vez que esse projeto é gerenciado pela Secretaria Estadual de Educação e a de Esporte. Aquelas entidades que se envolveram com a Federação tiveram um diferencial que é o know how, que temos no MS há 18 anos, tem projeto aqui em Campo Grande, são 18 anos de experiência. Então a gente sabe o que dá certo e o que não dá . E a idéia nossa é que passando essas 20 mil escolas do Brasil, aquelas escolas que o professor já foi capacitado, já tem uma dinâmica, eles possam usar o xadrez quando chove, essa que é a idéia. Eu mesmo, como consultor do projeto, não defendo que o professor fique sendo remunerado, até porque isso encarece o projeto. A gente quer é repassar esta ferramenta e depois do professor capacitado, ele usa. Agora, se o governo ou o Estado achar que dá para sustentar uma ação contínua e ficar pagando como extra R$ 200 por mês, por professor, aí a decisão é governamental. O xadrez agradece. Para se ter uma idéia, nós tivemos agora cinco mil crianças envolvidas com o projeto. Hoje a Federação coordena 106 professores aqui que atinge 10 mil crianças em Campo Grande no xadrez. A nossa Federação tem algumas particularidades, ela é centralizadora e tem um controle no xadrez, então você tem hoje 10 mil alunos jogando xadrez em Campo Grande com a supervisão e coordenação da Federação, eu acredito que não tenha Federação tenha metade disso, nenhuma. Porque não tem o trabalho que a gente tem. Se você falar onde está o professor da escola tal a gente vai lá e busca e diz onde está. É um trabalho que a gente conseguiu fazer e com a nossa dinâmica, funciona.

Esporte Ágil - Tem alguém na sua família que também joga xadrez?
Orlando Silvestre - Não. Talvez meu filho que fez dois anos e meio. O xadrez tem uma questão que saiu na Folha e eu concordo, por isso não recomendo o xadrez abaixo de 10 anos. Nunca tinha uma preocupação científica, então a Folha publicou dados, de uma pesquisa brasileira que fala que a criança até os 10 anos, ela consegue absorver 10% da sua capacidade total de prática e técnica. Com 10, 11 anos ela está com 50, 60% da sua capacidade mental e física, daí ela vai ter um crescimento exponencial. Eu sempre falo assim: não ensine xadrez abaixo dos 10 anos mais eu não tinha amparo científico. Hoje com esse trabalho da Folha a gente explica por que não recomenda o xadrez abaixo de 10 anos. Infelizmente, a Federação Nacional começou a fazer o brasileiro sub-8 e os pais não querem entender. Por isso nós realizamos o campeonato estadual sub-8 em Corumbá e Campo Grande. E agora vamos fazer os escolares sub-9. Por que a precocidade hoje das gerações tem caído, mas eu não recomendo xadrez para crianças abaixo de 10 anos.

Esporte Ágil - Vai ter alguma disputa do estadual agora no segundo semestre?
Orlando Silvestre - O xadrez tem uma característica, nós distribuímos por ano 32 títulos estaduais, um é principal, que é o absoluto e é o mais difícil. Tem duas semifinais e vai para a final os oito melhores, e daí sai o campeão absoluto. O nosso calendário é europeu, lá ele entra de férias agora e nós entramos de férias em dezembro. Então somos obrigados a fazer os nossos brasileiros no começo do ano, no primeiro semestre, tem os estaduais até março, abril. A Confederação também faz no máximo em abril os brasileiros, os campeonatos Pan-Americanos fazem em julho, e o mundial em outubro, novembro. Somos obrigados a antecipar, praticamente, em 6, 7, 8 meses. Os estaduais já foram feitos nas categorias sub-8 até over-60. Temos no xadrez o Blitz, que é o 5 minutos e o Ativo que é 20 minutos, e o xadrez pensado que é acima de uma hora. Então temos três tipos de xadrez, e já fizemos, no primeiro semestre, um campeonato Ativo e Blitz, tanto no absoluto quanto nas categorias. No primeiro semestre, por uma opção de calendários, a gente antecipa. No segundo semestre fica a questão do absoluto com duas semifinais e um classificatório para o estadual do interior. E o absoluto em novembro,dezembro. E para as crianças não perderem o pique, imagine ela entra de aula, por que elas vivem em função do calendário escolar, e logo no começo do ano já tem o estadual, ela está desarticulada. Nós fazemos no Dia das Crianças a nossa maior campeonato de nível técnico, que é o Campeonato Estadual de Xadrez Escolar que esse é o sub-9, sub-11, sub-13, sub-15 e sub-18, em cinco categorias, masculino e feminino, que não é adicional, ao sub-8, 10, 12 para não falar que é a mesma coisa e para que a criança não jogue com o mesmo adversário nas duas competições. No xadrez é tudo pensado, então em outubro tem o xadrez escolar e em 26 de agosto vai ter a vigésima primeira Taça Campo Grande. É um torneio que todo mundo quer ganhar pra colocar para colocar na galeria de conquista. No nosso calendário, vamos ter o Campeonato Brasileiro Escolar em agosto, o Brasileiro Rápido e o Brasileiro Amador.

Esporte Ágil - E do brasileiro já seleciona para o mundial?
Orlando Silvestre - Não, já selecionou no brasileiro de idade, agora já teve o Pan-Americano e o mundial. Por isso é que estamos com uma dinâmica aqui no Estado um pouquinho diferente no semestre, por que ficaria vazio o calendário para as crianças, os adultos não. Agora que os adultos vão jogar o absoluto, só que as crianças não entendem isso. O nosso calendário estabelece em janeiro 120 eventos em 50 semanas, tira o mês de férias, 15 de dezembro a 15 de janeiro. Hoje, se a pessoa quiser jogar xadrez ou alguns esportes ele pode praticá-lo durante um ano inteiro, o que não era da realidade quando a gente começou, só tinha o Jems (Jogos Escolares de MS), os jogos da UCE (União Campo-grandense de Estudantes), eram 4 a 5 competições por ano. Hoje você tem um em cada semana.

Esporte Ágil - Tem algum livro, algum filme sobre xadrez para as pessoas conhecerem mais da modalidade?
Orlando Silvestre - Tem o filme Lances Inocentes é um super talento americano que com inocência falou para o adversário se ele promovesse o empate, porque a partida foi tão disputada, só tinha peão e rei no tabuleiro, que ele ia promover, ia dar cheque e o outro também ia promover, mas ao promover ele ia dar cheque e ia comer a dama do outro, quer dizer ele ia ganhar, um ofereceu o empate, o outro não aceitou, ele ganhou. Então foi muito bonito, chama Lances Inocentes, temos vários filmes em que o cenário é o xadrez, inclusive Casablanca, que aparece lá o ator principal jogando xadrez na capela em Bagdá, Egito, fica tudo desenvolvido em cima dele num tabuleiro ele vai jogando é galã, e sempre num tabuleiro jogando xadrez nos cafés do Oriente Médio. Temos vários filmes como referência, mas hoje o xadrez, na nossa realidade, em 2004, eu posso citar a questão da Internet. Eu não recomendo ninguém comprar nenhum livro, nada, recomendo Internet, se a pessoa não tem acesso a Internet não ta no setor mundial. Hoje é tudo Internet. O site que eu recomendo é o Xadrez Online da UOL, xadrezonline.com.br , que tem todos os tutoriais até o nível avançado, e lá também tem sala de jogos. O Yahoo mesmo tem sala de jogos, esse é um bom número para gente discutir, é que enquanto a dama tem cinco mil pessoas, no xadrez tem 80 mil. Deram por impressionante a questão do xadrez na Internet. E se você não tem acesso à internet você não vai conseguir trazer um xadrez de ponta. Hoje, nos campeonatos mundiais o tabuleiro é imantado, é digital e na hora que a pessoa pega na peça já brilha no tabuleiro que ele pegou naquela peça, você acompanha Online, todos os campeonatos mundiais e torneios importantes. Você entra na internet e a hora que o jogador pega, além de ter o olhinho lá, você vê a reação do jogador, e na hora que ele pega a peça já brilha e você tem a sensação de estar jogando. Se você não tiver acesso à Internet, você vai fazer outro esporte, aqui no Estado a gente também força isso.

Esporte Ágil - Você é palmeirense. E quais outros destaques no esporte você tem para nos contar?
Orlando Silvestre - O Palmeiras me deu o grande prazer, eu ganhei um título do Palmeiras em 2002, no dia do meu aniversário. Um grande amigo resolveu me presentear, com sócio do Palmeiras e aí como tinha a questão da afinidade pelo xadrez, cheguei lá e conseguir jogar na categoria máster, em São Paulo fui terceiro no xadrez pensado e campeão da Blitz em 2002. No ano passado nós jogamos pela Ilha Solteira com uma equipe e lá estava o Mequinho, se eu jogasse no time da Capital não poderia jogar os jogos do interior. Como a gente priorizou os jogos do interior, pra mim foi um grande prazer ter jogado pelo Palmeiras, ter ganhado títulos. E no ano passado uma equipe nossa que teve a oportunidade de jogar com o Mequinho e ganhar medalhas.

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